Os resultados da fertilização in vitro (FIV) melhoraram bastante durante sua história relativamente curta. Os avanços nos protocolos de estimulação e nas técnicas de laboratório contribuíram para os grandes avanços obtidos nas primeiras décadas da prática da FIV.
Mais recentemente, a atenção se concentrou na genética do embrião, com o surgimento da biópsia do blastocisto e do sequenciamento de nova geração (NGS) para a triagem de embriões, visando selecionar blastocistos euploides e evitar a transferência de embriões aneuploides (com alterações cromossômicas). Apesar desse progresso, os embriões euploides (cromossomicamente normais) de alta qualidade (morfologicamente normais) nem sempre conseguem se implantar.
A falha de implante de um embrião euploide pode sugerir uma fonte não embrionária de falha de implantação, com problemas de receptividade endometrial representando outra causa potencial. A implantação humana é um processo intrincado que requer um “diálogo” sincronizado entre um embrião saudável e um endométrio receptivo.
A janela de implantação é descrita como um intervalo de tempo curto com receptividade endometrial máxima, em que o endométrio fornece um ambiente ideal para o desenvolvimento do embrião e a formação da placenta.
Estima-se que os embriões sejam responsáveis por um terço das falhas de implantação, enquanto a receptividade endometrial subótima e o diálogo embrião-endometrial alterado são responsáveis pelos dois terços restantes. Isso estimulou ainda mais a investigação da receptividade endometrial, com a intenção de melhorar as taxas de gravidez após a transferência de embriões congelados.
Com o advento da tecnologia NGS, o estudo do endométrio se tornou substancialmente mais sofisticado. O teste de receptividade endometrial (ERA) é um novo teste de diagnóstico que mede a expressão endometrial de 248 genes e categoriza o endométrio de uma paciente como pré-receptor, receptivo ou pós-receptor.
Pacientes com resultados não receptivos podem ter o tempo da transferência embrionária ajustado em um ciclo de transferência posterior (porque os resultados são reproduzíveis em ciclos posteriores), para o que é chamado de uma transferência de embrião personalizada.
O ERA é considerado uma técnica complementar à fertilização in vitro (FIV), que pode superar muitas barreiras no processo da fertilidade. Deve-se analisar cada caso para avaliar a necessidade da realização do exame, pois não é uma indicação de rotina.
Como funciona o ERA
O ERA é um exame que foi desenvolvido como um método de datação para identificar o estado de receptividade endometrial, como um meio de personalizar o tempo de transferência de embriões. Quando realizado com preparo endometrial, ele começa com a administração do hormônio estradiol no início do período menstrual da mulher. A aplicação ocorre por via oral ou por via transdérmica (adesivo ou gel).
Após cerca de 10 dias, realiza-se uma ultrassonografia transvaginal para avaliar o padrão e a espessura do endométrio. Se estiver no momento certo, inicia-se a administração da progesterona via vaginal. Após 5 dias da administração da progesterona, a biópsia endometrial é feita com um cateter “Pipelle”. A amostra é processada e enviada de acordo com o protocolo do fabricante.
Quando ocorre de forma natural, o método é feito durante o ciclo menstrual com a ovulação espontânea, sem a necessidade de utilizar hormônios para preparar o endométrio. O dia da biópsia depende do dia da ovulação e é feita 7 dias após o pico de hormônio luteinizante (LH), o responsável pela ovulação. Para isso, a paciente realiza um exame de sangue ou de urina para identificar o dia de pico do LH.
Os resultados do ERA são classificados como receptivos ou não receptivos. Os resultados não receptivos são considerados pré ou pós-receptivos e os detalhes para recomendações de ajuste endometrial são documentados.
Blastocistos vitrificados são reaquecidos e transferidos após o recebimento dos resultados do ERA, normalmente no ciclo subsequente à biópsia endometrial. Pacientes com endométrio receptivo são submetidos à transferência dos embriões congelados em um ciclo de preparo endometrial simulando o ciclo ERA.
Em pacientes com uma janela de implantação modificada, a transferência é ajustada em ciclos subsequentes com base na janela de implantação, com ciclo personalizado identificado pelas recomendações do ERA.
Como o ERA é feito na reprodução assistida
O ERA é realizado durante a fertilização in vitro, uma técnica de alta complexidade com procedimentos modernos e eficientes que pode ajudar inúmeros casais a conseguirem realizar o sonho de alcançar a gravidez.
A FIV é uma técnica de reprodução assistida feita em 5 etapas, também sendo possível a realização de técnicas complementares:
- estimulação ovariana: com medicamentos de base hormonal, estimulamos os ovários da paciente a recrutarem um número maior de folículos, aumentando as chances de sucesso da FIV;
- punção folicular e coleta dos espermatozoides: quando se encontram em um nível ideal de desenvolvimento, os óvulos são aspirados e separados para o tratamento. Em paralelo, os espermatozoides são coletados por masturbação e, em alguns casos, podem ser utilizados de banco de doações. Os gametas passam por preparações e são selecionados somente os melhores;
- fecundação: a fecundação na FIV é feita com ICSI (injeção intracitoplasmática de espermatozoides), em que cada um dos espermatozoides coletados é injetado individualmente em cada um dos óvulos;
- cultivo embrionário: após fecundados, os óvulos permanecem em um meio de cultura adequado para se tornarem embriões e se desenvolverem;
- transferência embrionária: no momento certo, os embriões gerados são transferidos ao útero e precisam se fixar no endométrio, camada que reveste o útero por dentro.
O ERA é realizado antes da última etapa, com os embriões formados e prontos para a transferência. O exame é feito para avaliar a janela de implantação da mulher e definir o melhor momento para a finalização do procedimento.
O teste pode ser indicado principalmente para mulheres em tratamento pela FIV que passaram por três falhas em tentativas de implantação embrionária. Entretanto, estudos não apoiam o uso do teste ERA como uma forma de melhorar os resultados da gravidez em pacientes com bom prognóstico.
As falhas de implantação ainda são um desafio para a medicina, e mais pesquisas são necessárias para trazer benefícios reais nas taxas de gravidez.